quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Connected

Se gosto da chuva que me escorre da cara, se gosto da lama que piso, do frio que me corta a pele e sustém a respiração, se gosto do breu da noite, da nuvem que me assusta, do gelo que me faz abrandar o passo, do cheiro a cão no elevador. Se gosto da pedra onde tropeço, da distância que me cansa, do vegetal de sabor estranho, do pedinte que canta mal... É que me dá saudades da ligação à terra. Gosto das paredes que me protegem, mas confinam-me. Gosto da tecnologia que me distrai mas descentra-me. Preciso de praia, de passear de bicicleta, de silêncio. E gosto disso.

1 comentário:

Th.M. disse...

Os prazeres experimentados no que poderia supor de agastamento e desânimo nascem da consciência de uma ligação que lhes dá sentido: a «terra»! Nenhum outro lugar da vida humana é capaz, com efeito, de encaixar de modo mais preciso na necessidade vital do outro para sentir-se eu e na aspiração de totalidade (expressa tão claramente quando dizes: «E gosto disso»).

É perceptível a tua sensibilidade mais recôndita, garantindo assim a espontaneidade e a globalidade da tua resposta de confiança, na qual se apreende também a implicação do teu psiquismo e, talvez mais particularmente, das tuas estruturas afectivas e simbólicas mais profundas. As «saudades…» podem significar o desejo de uma vida “com os pés na terra”, isto é, na fidelidade a ela, e não a partir da sua negação mais ou menos camuflada. De facto, o que experimentas como aprazível, numa repetição cadenciada: «gosto…», transcende essa terra, mas remete inconfundivelmente para ela.

É belo como acedes à realidade que te excede e encontras aí a possibilidade de um tu não necessitado, mas sim desejado, que ao mesmo tempo te encaminha para essa realidade como um projecto de felicidade.

Concluo como tu: E gosto disso.